O que muda no mundo pós-pandemia e como afeta a cada um de nós?

Muito se tem falado sobre o “novo normal” do mundo após o covid-19, mas, o que isso tem a ver com cada um de nós?

Stael Ferreira Pedrosa

O mundo pós-pandemia, segundo muitos, vem assinalar o fim do século XX – como a primeira guerra assinalou o fim do século XIX – que é um divisor de águas entre o passado e o futuro, entre outras expressões que nos remetem ao encerramento de um período e início de outro. A maioria de nós pode dar de ombros e dizer: “acho que nada vai mudar de verdade”; e é possível que não mude para a maioria, principalmente para os mais ricos, mas, é fato que a pandemia veio trazer novos olhares sobre muitos aspectos da humanidade. E esses olhares mostraram coisas que não esqueceremos facilmente e nem nos desvencilharemos de seus desdobramentos.

Talvez a maior consciência que tenhamos adquirido é que todos nós, seja como pessoas, famílias, comunidades, cidades, estados e países, temos que rever nossas prioridades. O dinheiro, o trabalho, as compras e o individualismo se tornaram pequenos diante da vida e da morte, diante da família e das relações de afeto.

A partir dessa perspectiva, todas as relações humanas (bem como a sociedade e o mundo) tenderão a se reconfigurar. Nem é questão de “se vai acontecer”, mas de “quando”.

Vários especialistas em comportamento humano, história, biologia, sociologia, entre outras ciências, são unânimes em afirmar que mudanças dramáticas irão acontecer e quais são essas mudanças? Será melhor ou pior? Embora estas perguntas ainda não possam ser respondidas, muitos já apresentam suas ideias sobre o novo mundo.

Relações de trabalho

De acordo com Nusseir Yassin, do blog Nas daily, os olhares do mundo perceberam que as relações de trabalho vão mudar e com elas, as cidades. Os donos de empresas realizam que não precisam gastar fortunas alugando grandes escritórios em centros empresariais. Cada trabalhador destes escritórios pode trabalhar a partir de casa.

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Diminuindo o número de pessoas “indo” a um local de trabalho, o trânsito diminuirá, bem como a poluição. Já que o trabalhador pode “levar” seu trabalho consigo para onde for, por que não morar numa cidade do interior, ou na praia? Além disso, o tempo gasto em deslocamento poderá ser usado para se adquirir uma renda extra ou de forma mais agradável como exercitar-se, brincar com as crianças ou passear com o cachorro.

Também há o fato de que muitas pessoas deixam sua cidade natal para morar perto do trabalho, pagam aluguel em grandes centros (mais caros) e se não precisarem mais fazer isso, terão mais dinheiro – importante em um mundo mais pobre pós-pandemia – e assim se estressarão menos.

A questão é que nem todos os trabalhadores se encaixam no perfil do trabalhador de escritório. Embora exista a possibilidade de a maioria das compras (até supermercado) puderem ser feitas on-line, existem profissionais como dentistas, cabeleireiros, manicure, mecânicos, ou os da construção civil e outras frentes que não podem ser de acesso remoto. É necessário interagir com as pessoas ou estar no posto de trabalho.

A convivência escolar

O coronavírus veio para ficar. Por isso, uma tendência cada vez maior – o ensino à distância – tende a se consolidar no mundo pós-pandemia, afinal os filhos são os maiores bens humanos e devem ser preservados a todo custo. Como diz Karen Aronian, especialista em educação, colunista de pais e educadores e pesquisadora de políticas educacionais na Universidade de Columbia, a volta à escola será “como a metáfora da criança na loja de doces: aqui estão seus amigos – mas você não pode tocar neles, brincar com eles, compartilhar comida com eles, apertar as mãos, abraçar e nem sussurrar, enfim, não pode chegar perto. Algo bastante difícil especialmente para as crianças pequenas.

Aulas completamente on-line talvez leve algum tempo, pois nem todos os estudantes têm acesso tecnológico, mas, certamente surgirão mais iniciativas públicas nesse sentido, já que aglomerações continuarão ainda um perigo no novo mundo antes de uma vacina eficaz. No entanto, a ideia de aulas on-line prevalecerão e os prédios escolares aos poucos se tornarão obsoletos, e os municípios e estados não precisarão mais gastar com toda essa estrutura, podendo investir em acessibilidade.

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A Escola terá que ser mais criativa quanto ao projeto político pedagógico e os professores terão que rever seus métodos didáticos, investir em educação continuada e certamente se prepararem para o desafio de ensinar on-line.

Um dos grandes problemas que se enfrentará, certamente, será a pouca socialização. As pessoas com deficiência – como os alunos da inclusão – serão as mais prejudicadas, já que a socialização escolar é fundamental para estas. Também sofrerão as redes de apoio (seja a essas crianças ou às mulheres e populações em situação de vulnerabilidade).

As relações sociais

Assim como as empresas e escolas, os outros ambientes onde as pessoas costumavam se aglomerar serão repensados. As casas de shows, arenas e espetáculos se reconfigurarão também – sendo on-line (lives). Provavelmente o mesmo se dará com eventos em ambientes fechados, como festas, partidas de futebol, visitas a museus etc.

Aumento das desigualdades

Em artigo para O Globo, Alfredo Pinto – chefe da Bain & Company na América do Sul – preconiza que se iniciará a reversão da globalização e o aumento das desigualdades:

“Se a globalização já vinha se desacelerando com a guerra comercial entre EUA e China, agora passará por uma reversão. Com as dificuldades nas cadeias de suprimento hoje, muitas empresas buscarão alternativas mais locais. A disponibilidade ganhará ascendência sobre a eficiência”.

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Nesse aspecto há vantagens para o Brasil devido à grande produção de alimentos.

No entanto, essa “desglobalização” trará aumento da pobreza em todo o mundo, e a revolta dos menos favorecidos pode ser maciça, de acordo com Parag Khanna, estudioso indiano. Khanna ainda afirma que quanto ao Brasil a principal lição a ser aprendida é política: “um país deve ter um governo competente com administradores treinados e comprometidos com o interesse público”.

Mudanças nem sempre são ruins

Se tais mudanças serão boas ou ruins, só saberemos com o tempo. Fato é que o planeta e a humanidade não estavam indo muito bem mesmo. Talvez essa reconfiguração seja como um remédio amargo, mas que, ao final, trará a cura. O ser humano tem grande capacidade de se adaptar às circunstâncias e criar caminhos alternativos – somos mais resistentes do que imaginamos. No momento, o mais importante é nos cuidarmos, ter paciência, resiliência, e se você puder, invista em um bom wi-fi.

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Stael Ferreira Pedrosa

Stael Ferreira Pedrosa é pedagoga, escritora free-lancer, tradutora, desenhista e artesã, ama literatura clássica brasileira e filmes de ficção científica. É mãe de dois filhos que ela considera serem a sua vida.