Como estragar completamente uma mulher grávida

Mimar uma gestante não é nada inteligente. Cuidar não significa sufocar com atenções exageradas e presentes demais.

Fernanda Ferrari Trida

Escolhi escrever sobre esse tema por dois motivos. Primeiramente, achei que uma abordagem mais leve e, quem sabe, até mais divertida sobre a gravidez e as transformações que ela causa na vida da mulher e de todos que a cercam seria mais interessante que expor dados e fatos baseados em estudos – que muitas vezes nem entendemos direito. Em segundo lugar, minhas experiências como gestante (sou mãe de duas lindas crianças) foram totalmente diferentes uma da outra no que tange ao tratamento que a família, os amigos e meu marido me deram durante o processo.

Palpites, conselhos, mimo

Quando engravidei da minha primeira filha, a família toda parecia ter engravidado junto. Todos tinham conselhos “importantíssimos” para dar, presentes para oferecer e receitas do tempo da vovó para ensinar. “Não ande descalça, faz mal para o bebê” (hein?!); “Trate de doar logo seus gatos, porque você pode pegar toxoplasmose” (opa! existem exames para os humanos e para os felinos e tratamento para essa doença… coitados dos gatos!); “Trouxe presentes para o bebê” (minha mãe aparecia com um monte de sacolas em casa cheias de roupinhas, muitas das quais a Marcela nem chegou a usar porque ficaram pequenas rapidinho); “Pare de trabalhar como veterinária, é um risco enorme para o bebê” (Como? Deixar de trabalhar? Quem pode fazer isso hoje em dia? Risco? Tomei todo o cuidado e só parei de trabalhar aos oito meses de gravidez, porque eu nem conseguia mais subir uma escada de tão cansada que ficava).

Além disso, meus sogros, cunhados e pais viviam na minha casa. Era, praticamente, um exame clínico sempre que chegavam. Olhavam o tamanho da barriga, perguntavam o que eu estava comendo e se estava dormindo bem e depois de uns 20 minutinhos, pediam para que eu fosse para o quarto me deitar. Respondia que não estava cansada, mas de nada adiantava. Nunca dormi tanto na vida quanto durante essa gestação!

Os desejos e a paciência do marido

Se eu quisesse comer algo diferente (ah, os desejos!), logo aparecia meu marido e minha mãe com o quitute requerido – não foi à toa que ganhei 20 quilos durante a gestação. Quando meus hormônios me deixavam maluquinha, maridão estava lá com toda a paciência do mundo para ouvir gritos, choro e reclamações. Já minha mãe e minha sogra achavam que conseguiriam conter a “fúria da mulher grávida” com muitos bolinhos de chuva e bolos de cenoura com cobertura de chocolate (hummm!).

Godzilla? Não! Gravidazilla!

Não preciso dizer que com esse tratamento VIP, transformei-me na “gravidazilla”. Nada nunca estava do jeito que eu queria e todos os outros pareciam ter a obrigação de me agradar o tempo todo. Eu era uma rainha e os amigos e familiares, meus súditos. Como aguentamos nove meses disso?

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Acho que a culpa foi de todos nós. A família estava esperando a vinda da primeira neta, primeira sobrinha, primeira prima, primeira filha, primeira tudo. Na cabeça deles, a mãe deveria ser muito bem cuidada, quase como uma doente em estágio terminal. Meu marido chegava a ligar para a casa do obstetra às três da manhã para saber por que eu estava com gases (pode?). E eu, que adoro paparicos (quem não gosta?), deixei-me levar totalmente.

A preocupação com o bebê

Nem preciso dizer que depois do nascimento da Marcelinha todos esqueceram a minha existência. Tinham olhos para o bebê. E só para o bebê. Eu caí literalmente do cavalo (que acreditei ser branco, alado e puro sangue). Havia momentos em que eu falava: “Ei pessoal, eu estou aqui, estão vendo? Um copinho d’água por favor? Um bom dia pelo menos?”. Nada. Nenhuma resposta. Fiquei bem chateada. Como assim tiraram minha coroa de uma hora para outra? Foi uma fase bem difícil. Mas a felicidade que minha filha me trouxe apagou qualquer necessidade de ser o centro das atenções.

Uma prova de confiança e amor

Já durante a segunda gravidez, acho que por saber o que estava por vir, finquei o pé no chão e criei raízes tão sólidas que todos passaram a me respeitar e entender que era capaz de cuidar do feto tão bem quanto qualquer gestante. Dessa vez, me vi como uma mera plebeia, com uma filha para cuidar e outro a caminho. Meu marido ainda me fazia as vontades (santo homem), meus hormônios ainda enlouqueciam, mas as outras pessoas viram que mimar uma mulher grávida não é nada bom.

Não estamos doentes. Estamos grávidas. Família, amigos, marido: guardem a maior parte dos cuidados exagerados e infundados para os netos. Eles vão adorar fazer tudo aquilo que os pais não deixam em casa. Confiem na futura mamãe. Deem liberdade para ela curtir este momento, pois ele passa rápido demais.

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Fernanda Ferrari Trida

Fernanda Trida é jornalista, médica veterinária, dona de casa, esposa, mãe de Marcela, com três anos, e de João, com um ano de idade.