Os contos como terapia infantil

Os contos infantis são poderosas ferramentas para trabalhar e conhecer nossos filhos

Stael Ferreira Pedrosa

Recentemente me foi proposto traduzir um artigo da escritora Emma Sánchez aqui do site, que é uma pedagoga e terapeuta do México. O artigo é de grande relevância, já que trata da terapia para crianças utilizando-se os contos criados para essa etapa de vida. O impedimento, no entanto, é que a literatura por ela indicada é, em sua maioria, completamente desconhecida para os leitores brasileiros.

Impossibilitada de indicar ou mesmo adaptar a leitura terapêutica proposta pela autora, é que se buscou embasar este artigo no dela e pesquisar a literatura mais indicada para substituir as por ela propostas.

Segundo autores, a psicoterapia infantil tem recebido os olhares de interesses dos profissionais da área nos últimos anos, especialmente no que se refere à prevenção e à promoção da saúde mental, nas mais diversas estratégias de alcance e aplicação de acordo com as necessidades das crianças

Para Emma, os contos infantis são de grande importância como uma maneira de chegar à imaginação da criança, e a partir daí, alcançar inúmeras oportunidades de aprendizagem e reflexão. Por isso psicólogos e terapeutas infantis os usam como um “caminho direto ao seu mundo emocional e, sobretudo, à sua mente inconsciente”, e assim, prevenir psicopatologias na vida adulta.

Para Emma, as crianças passam dificuldades às vezes, e um apoio terapêutico pode ser benéfico; e os contos são um excelente recurso para isso. Segundo a autora, os contos e histórias podem permitir às crianças, expressar os seus conflitos internos e até os medos mais profundos que possam experimentar, e então encontrar uma solução.

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O que está de acordo com a Revista Brasileira de Psicoterapia, que afirma que a utilização dos contos na psicoterapia infantil proporciona à criança um espaço acolhedor e uma via de acesso para expressar seus sofrimentos, angústias, ódios e dores, inveja, ciúme, medo, problemas e conflitos familiares ou na relação com outras crianças, além do medo da morte, que talvez não possam ser expressados de forma explícita em outra situação.

Todos gostamos de histórias

Quem não lembra com carinho dos momentos em que nossos pais, tios ou avós, contavam suas história ou liam algo na hora de dormir? As histórias e contos infantis trazem consigo memórias afetivas que nos encantam.

Emma traz à questão as pesquisas de Jean Piaget, que apresentou as etapas de desenvolvimento cognitivo em que se pode reconhecer que a criança escuta e vê os contos, e então absorve, crê e aprende formas de comportamento, raciocínios e consequências das ações. Conforme se cresce e vê-se as mesmas histórias e contos de maneira diferente, adquire-se maior profundidade, pois nossa mente e pensamento vão evoluindo.

Para a autora, além dos contos existe a TCC (Terapia cognitiva comportamental) que,assim como os contos, utiliza do jogo simbólico e do desenho, da criatividade da criança como poderosas ferramentas para trabalhar e conhecer nossos filhos.

As mensagens dos contos infantis

Pode-se começar pelos contos infantis mais conhecidos para que a criança entre em contato com situações que possam ser benéficas na construção de sua psique:

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O patinho feio. Um conto muito antigo que nos fala da resiliência e de outras condutas a imitar e a rejeitar.

A pequena sereia. Um conto que foi contado de muitas maneiras e que os pais podem contar de acordo com a lição que se busca dar. Ambos são de Hans Christian Andersen.

Clifford, o gigante cão vermelho, cujas aventuras são baseadas em valores.

Um caso grave de listras, que trabalha a autoestima infantil e ensina a lidar com as opiniões alheias.

Onde vivem os monstros, que, segundo a resenha disponível na Amazon, trata-se de “uma bela obra sobre a infância e a eterna luta entre a liberdade almejada pelas crianças e a autoridade dos pais”.

O pato, a morte e a tulipa, aborda o conceito filosófico “para onde vamos após esta vida”. Através desses três personagens, as crianças podem compreender a morte e a transcendência dos seres que amamos, diz Emma.

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Os contos infantis com fins psicoterápicos

Celso Gutfreind, em seu livro O Terapeuta e o Lobo, diz que a contação de histórias é um meio de, dentro do tratamento psicológico da criança, possibilitar a ela não apenas entrar em contato com os conflitos psicológicos não resolvidos, mas estimular a criatividade, o lúdico, a expressividade e a autonomia.

E fazem isso à medida que trazem à tona situações que a própria criança vive em seu inconsciente e com as quais pode se identificar. Ao identificar tais situações como comuns a outras pessoas através do personagem, é possível à criança transformar o conteúdo de seu inconsciente, diminuir o teor nocivo e as pulsões deste.

Aqui são citadas duas fontes de possível terapia. Para saber mais, acesse aqui e aqui.

Contos que curam

Este livro reúne estudos, contos e práticas de especialistas na elaboração das mensagens que as histórias transmitem, tanto para a mente consciente, quanto para a inconsciente. Assim, crianças, adolescentes e adultos podem entrar em contato com suas preocupações e desejos expressos através dos contos que possuem ao menos cinco funções ou utilidades:

1. Mágica: estimular a imaginação e a fantasia;

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2. Lúdica: entreter e divertir;

3. Ética: transmitir ensinamentos morais e identificar valores;

4. Espiritual: compreensão de verdades metafísicas e filosóficas;

5. Terapêutica: encontrar nos personagens e situações referências para a vida, além da orientação para compreender o mundo interior e os conflitos.

A turma da Mônica

A turma da Monica, quadrinho brasileiro bem popular entre as crianças e adultos, com suas historinhas divertidas, apresentam situações do nosso dia a dia, muitas vezes mais fantasiadas, mas que representam o desejo de cada personagem, e como lidam com essas situações. Embora não esteja na categoria “contos”, é uma literatura voltada ao público infantil e que, assim como os contos, permite à criança entrar em contato com o universo de outras crianças, observar seus comportamentos, receios, conflitos e como estes se resolvem, de maneira lúdica.

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Em sua pesquisa, Luciana Stec e Simoni Antunes Fernandes notaram semelhanças entre as crianças observadas e os personagens das histórias, principalmente pela agitação e agressividade, inclusive um com dificuldades na fala, como o cebolinha. Segundo as autoras, “a raiva é a emoção mais fácil de sentir, e muitas crianças acabam por usar o comportamento agressivo ou desafiador para mascarar outros sentimentos, como a tristeza profunda”. Com a inserção das histórias em quadrinhos da turma da Mônica, elas podem expressar toda essa agressividade, evitando internalizá-la.

Para Emma, é importante que sejam livros: “há alguns contos em vídeo ou filmes mas, na verdade, não há como ler o livro e deixá-lo por aí para que nosso filho o releia todas as vezes que quiser, até assimilar. Mas se o comportamento do seu filho lhe preocupa, nunca hesite em consultar um especialista”.

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Stael Ferreira Pedrosa

Stael Ferreira Pedrosa é pedagoga, escritora free-lancer, tradutora, desenhista e artesã, ama literatura clássica brasileira e filmes de ficção científica. É mãe de dois filhos que ela considera serem a sua vida.